Camus ano 98

Ah! era assim mesmo, a vida desse menino tinha sido assim... com seu sangue jovem fervendo, um apetite devorador pela vida, a inteligência audaciosa e ávida, e um longo delírio de alegria entrecortado por freadas bruscas que lhe eram impostas por um mundo desconhecido, deixando-o confuso, mas logo depois refeito, procurando compreender, saber, assimilar esse mundo que não conhecia e no fundo assimilando-o porque o abordava de modo ávido, sem se furtar, com boa vontade mas sem baixeza e sem nunca perder uma certeza tranquila, até mesmo uma segurança, pois ela lhe assegurava que conseguiria tudo o que queria e que nada, jamais, nesse mundo e apenas nesse mundo seria impossível para ele e preparando-se (e também preparado pela nudez de sua infância) para encontrar sempre seu lugar onde quer que fosse, porque não desejava lugar nenhum, mas apenas a alegria, os seres livres, a força e tudo que a vida tem de bom, de misterioso e que não se compra e nunca se comprará. Preparando-se mesmo à custa da pobreza para ser capaz um dia de receber dinheiro sem nunca ter pedido e sem jamais ser submisso a ele...
Albert Camus, “Obscuro a si mesmo”, in O primeiro homem, trad. T.B.C. Fonseca e M.L.N. Silveira.

Hoje, o autor completaria 97 anos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário